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Recebo algumas ligações e mensagens de leitores que opinam sobre algumas colunas que escrevo com teor político. Um deles até perguntou: para que lado tu torce? Tu é de direita ou de esquerda? Respondo: Não advogo, não milito, faço análise, interpretações de um momento da política, segundo minha ótica. Mas hoje em dia as pessoas tendem a rotular, enquadrar, inserir o comentarista numa marca ideológica e assim classificar de aliado ou inimigo. Faço reflexões sobre acontecimentos, palavras, declarações, posturas, fatos. Não tenho preguiça intelectual. Estava, ontem, na piscina do Clube Caiçara, quando se aproxima da minha mesa um velho conhecido, militante xiita da esquerda radical. Imediatamente iniciou uma narrativa burra de socialismo, enaltecia os avanços do país durante a fase de governo do seu partido, que não houve corrupção, que na Venezuela não é tão ruim assim, nem em Cuba. Que os fatos são distorcidos pela direita. Não suportei, detesto ignorância, detesto miséria filosófica. Pedi licença e me retirei para outra área do Clube.

Meu vizinho de mesa nunca soube o que é o totalitarismo na Rússia, querem acreditar no clarão mítico da Revolução cubana, nunca ouviram falar da Primavera cubana quando foram fuzilados ou mandados para prisões em 2003 dissidentes políticos. Não lembram de quando o Ministro da Justiça Tarso Genro expulsou os dois atletas cubanos que tentaram se refugiar no Brasil, fugindo do horror da tortura em Cuba. Os devolveu ao país de origem e nunca mais se ouviu falar deles. Imagino o que fizeram com eles. Em contrapartida o Presidente da República, no último dia de governo, assinou decreto não permitindo a repatriação do terrorista e assassino Cézare Battisti para a Itália. Enaltecem Daniel Ortega, ditador eterno da Nicarágua, parabenizado por um partido de esquerda após o “resultado” das eleições fraudulentas, quando o presidente mandou prender todos os seus concorrentes. O partido do meu desinformado ou maldoso vizinho de mesa, enaltece o governo corrupto da Venezuela, fingindo que não sabe o que lá acontece. A miséria, a fome, a deserção do seu povo. Advogo sim, pela ética, pela governança responsável, pelo respeito ao povo e ao Estado de Direito. Critico de forma persistente, sim, aquilo que está errado, venha da direita ou da esquerda. Não tenho a pretensão de ser o dono da verdade. Faço apenas provocações para que tiremos um tempo para fazermos reflexões sobre teoria política. Vamos fazer análise de fatos passados e presentes. E se meu visitante da mesa do Clube Caiçara quiser discutir sobre bases morais de alguns governos, venha. Mas, por favor, venha com argumentos mais sólidos, não com raciocínios rasos.

Então, conforme o título deste artigo, peço licença e me desvio do tema inicial para falar de algo muito diferente. Um tema mais soft. No Natal, nos reunimos em nossa velha morada, na Fazenda Mixaria, em São Francisco de Assis. Era um dia atipicamente quente, mesmo para os padrões de um mês de Dezembro. Primos, filhos, nora, genro, cunhados, amigos, vizinhos, sobrinhos. Alguns beberam o equivalente ao próprio peso em cerveja. Outros comeram como hienas. Eram todos jovens. Eu me senti velho em meio a todos. É uma sensação que venho tendo com freqüência nos últimos tempos mas que não me causa tristeza. Vivi muito bem as últimas sete décadas. Observei também alguns jovens de doze, quinze anos, totalmente alienados, mergulhados literalmente, em seus telefones celulares, sem conversar, sem interagir com ninguém. Se é assim que estas criaturas ocupam seu tempo atualmente, elas que fiquem com seus quinze anos. Se eu tivesse que terminar minha vida com um celular na mão durante quinze horas do dia eu procuraria razões para não dar um tiro na cabeça.

Mas a regra é que as pessoas são muito educadas, gentis. As pessoas com a média de trinta anos ou mais, são profundamente nobres, cavalheirescos. Amáveis mesmo. Sempre havia alguém á minha volta entabulando conversa. Perguntando sobre a velha morada, das pessoas que viveram ali no passado, me valorizando. Como de eu fosse testemunho da história. Sou celho mas tenho menos de duzentos anos. Eu explicava que naquele lugar, antes, muito antes, viviam meus antepassados. ___Estão vendo aquela timbaúva, bem no alto da coxilha? Pois ali morava o irmão do meu bisavô. As lavouras de soja invadiram tudo mas sobrou aquele pé de bergamotas que até hoje carrega bastante. Produz umas frutas com a casca grossa, muito boas. Dizem que bergamotas de tapera são as melhores. Meu bisavô, Fernando, teria repassado a história de que aquela bergamoteira era mal assombrada e que aparecia durante a noite uma figura vestida de branco, emitindo gemidos horripilantes. Seria a alma penada de um revolucionário que ali foi degolado. Ou seja, a polêmica política sempre esteve presente.

Contei á gurizada que nossa atual propriedade é apenas um pedaço ínfimo do que foi a grande fazenda dos nossos antepassados. Teria, no seu apogeu, cem quadras de sesmaria, mais de oito mil hectares de campo. Suas divisas ficavam em dois dos atuais municípios de São Francisco de Assis e São Vicente do Sul. Hoje brincamos de fazendeiros, como Juvenal Terra no romance O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo. Preservamos o que pudemos da velha casa. Quantas gerações habitaram nela através dos tempos. Muitos fantasmas devem rondar por aqui. Quantos dramas ali se passaram, quantas guerras vividas, quantos invernos. Quanta saudades sinto da minha avó (o avô eu não conheci), dos meus tios, dos meus pais.

Consegui me evadir do tema inicial. Obrigado pela compreensão.

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