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Quando enfim meu pai permitiu que eu fosse fazer a quinta série, em Jaguari, fui morar com minha tia. Na mesma casa moravam mais duas tias. Puritanas ao extremo. Profundamente religiosas, me obrigavam a ir à missas todos os domingos, freqüentar o catecismo, ler a Bíblia e coisas do gênero. No mesmo quarteirão havia um cabaré. A tia Odete, dona da casa, era costureira e costumava trabalhar numa sala grande, em frente de uma janela de onde se via o movimento na rua. Movimento quase exclusivamente de pedestres pois poucos carros haviam naquela época. Regularmente as mulheres da casa de diversão passavam em frente à nossa com destino ao açougue, instituto de beleza, mercados. Minha tia ficava irritada apenas ao vê-las. ___Desavergonhadas. Como pode uma mulher chegar a tamanha falta de vergonha. Deveriam se dar ao respeito e nem sair de casa. Outra tia, menos radical, refutava: ___Deixa elas. Essas pobrezinhas, são o que afinal todos sabem que são e não enganam ninguém. Não dizem uma coisa e fazem outra. Pelo menos não se misturam com muitas outras que se fingem de santas e freqüentam os bailes do Clube Comercial, vestidas de branco. Mas em verdade, agem como as mulheres da tia Zoca. Porque esse vício é mesmo que tatuagem; depois que entra na pele, nunca mais sai. E tem mais: Elas tem compostura, nem olham para ninguém. Pobrezinhas. São prostitutas mas têm seus princípios. E muitas estão lá por circunstâncias da vida, nem sempre por necessidade. E no fundo prestam um serviço à sociedade. Qualquer cidade precisa de putas, não fossem elas o que seria de nossas filhas, esposas, com esse garanhões que andam por aí? Quanto à nós, que nos julgamos melhor que os outros, pelo mal que fizemos nos últimos cem anos, deveríamos nos desculpar pelos próximos cem, ao invés de dar lição de moral aos outros.

Nunca mais ouvi a tia Odete implicar com as vizinha da dona Zoca. Mas sempre se referia à pessoas falsas, que pregavam uma coisa e praticavam outra. Como os fiéis que não perdiam uma missa mas viviam em “estado de pecado”, inclusive, muitos freqüentando a casa da Zoca. Costumava dizer que, por aqui, comunista vai à missa e diz que acredita em Deus. Suprema hipocrisia.

No Brasil de hoje vivemos um estado de mentiras, aparências, hipocrisia. Autoridades, ungidas pelo poder, se julgando seres supremos, falam com ares de sábios puros, infalíveis, perfeitos. Falácia, porque protegidos pela áurea do cargo, acusam, julgam e condenam outras pessoas à revelia da Lei. Isso é retrocesso moral, é hipocrisia. Autoridades responsáveis pela guarda da nossa Constituição não podem agir ao arrepio da mesma Constituição. Anularam a maior operação contra o roubo, no mundo, que foi a Lava Jato. Um Juíz não deve exceder seus limites. Não pode censurar e prender quem não pensa como ele. A impunidade é devida ao absoluto silêncio de quem deveria contrapor o excesso de autoritarismo; deputados e senadores, preocupados em engavetar processos, isto sim. Assim agem os dignos representantes do povo. Não é por outra razão que certas instituições estão entre as mais odiadas do país. Não sem razão muitas autoridades nem podem circular nas ruas porque seriam agredidas. São “personas non gratas”.

Na ultima semana o Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco trouxe à tona pacote que institui o chamado “qüinqüênio”, um afago à cúpula da magistratura com um aumento automático a cada cinco anos. Um adicional que nenhum de nós, que pagamos a conta, temos. Um Ministro do STF, já tem um salário de R$ 49.000,00 mensal. Mas a justificativa do Pacheco é de que esse aumento é para compensar privações. Ó Deus, permita-me viver nesse estado de “privações”. Hipocrisia!

Renan Calheiros, o puro, está trabalhando num pacote que prevê punição á quem contestar ou protestar contra o resultado das eleições ou incorrer em intolerância política, ou seja, vaiar político nas ruas ou em eventos. Vivemos um apagão de liberdade de expressão, da garantia individual e dos direitos do cidadão. Vivemos sob medidas claramente autoritárias, sob censura e nossos congressistas se fazem de toupeiras. Somem. Em um país, muito longe de Pindorama, oito empresários ousaram, em conversa particular de seus whats App, emitir opinião contrária a um candidato á Presidente daquele país. Foram acusados de fazerem parte de uma organização criminosa, tiveram suas contas bloqueadas, sigilo violado. Jamais a democracia no Brasil foi tão ultrajada e desafiada. Frente a este contexto preocupante, lembro do que meu pai falava: a soberba precede a ruína. Dias melhores virão.

Certas autoridades não demonstram qualquer apreço pelas regras da democracia, pelas normas do estado democrático de direito. Certos ungidos, na sua sede patológica de poder pessoal, arrogantes, autoritários, ameaçadores, geram conflitos, agridem, ferem. Estes estão causando a verdadeira ameaça à democracia!

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