Envelhecimento é um termo da biologia, caracterizado por um desgaste de energia vital ao longo do tempo, em consequência da passagem do tempo. A velhice traz consigo aspectos da representação social, das quais estão relacionadas à maneira como os idosos vivem, se veem ou são vistos.
A velhice consiste em não ser unicamente um estado, mas um constante e sempre inacabado processo de tornar-se sujeito (compreensão de si mesmo). Assim podemos dizer que na maior parte do tempo não existe um “ser velho”, mas um “ser envelhecendo”. Se o envelhecimento é o tempo da idade que avança, a velhice é o da idade avançada, em direção à morte.
As limitações corporais e a consciência da temporalidade são problemáticas fundamentais no processo de envelhecimento, aparecendo de forma reiterada no discurso dos idosos, embora possam adquirir diferentes reações e intensidades dependendo da sua situação social e da sua própria estrutura psíquica. Corpo e tempo se entrecruzam no devir do envelhecimento.
O velho, muitas vezes em questão da temporalidade, passa a se sentir “impotente” e “incapaz” de superar esse momento. A existência de um modelo vigente em que se prioriza o jovem, belo, forte e poderoso, faz com que se submeta a apagar as diferenças, passando para o interior do círculo de poder, fazendo tudo por se incluir, mas muitas vezes de forma maníaca e caricata, ou acaba por cair no isolamento, na renúncia ao poder desejar.
Todo sujeito é produto de um encontro, de uma articulação entre o seu interior e exterior, e esta não é apenas um fundamento de tornar-se sujeito, mas para constituir um espaço onde se encontram com os objetos que o satisfazem. “Esse discurso de exaltação da juventude e da produtividade propõe um modelo desvalorizado com o qual o velho se identifica, anulando sua condição desejante. Então, a falta de um reconhecimento social para a velhice, a falta de um lugar simbólico (inserção na família e em grupos de pessoas), o fato de não mais se satisfazer ou proporcionar satisfação, resulta numa desnarcisação do sujeito. Isto é, numa falta de investimento do ambiente em direção a esse sujeito, e vice versa, o que impede a compreensão das perdas e provoca um crescente empobrecimento da vida afetiva. Frequentemente, a resposta a este processo é a depressão ou a demência como defesa das ações ocorridas”, diz Daniara Wolf Kerkhoff, Psicóloga.
Na velhice, por ser um período de onde ocorrem perdas de objetos significativos e de lugares de reconhecimento simbólico, como também falha frequentemente a função reguladora do Ideal do Eu, faz com que então aconteça um confronto entre o Eu Ideal e a realidade corporal. Perde-se a beleza física padronizada pelos modelos atuais, a saúde plena, o trabalho, os colegas de tantos anos, os amigos, a família, o bem estar econômico, e fundamentalmente, a extensão infinita do futuro, e embora a qualidade de vida seja preservada, não pode ser evitado o sentimento de finitude que inexoravelmente se instala.
“Ser velho pode muitas vezes significar a perda da ilusão da própria potência, enfrentando a ideia de aproximação da morte e apesar disso, continuar lutando. Luta difícil, porque o luto que deve ser compreendido é o da própria vida, é um luto que age por antecipação, luto por um objeto ainda conservado, porém condenado: e a ameaça da vida e aproximação da morte, que não é um sentimento ao qual alguém se adapte. O Eu, antes de qualquer outra coisa, exige e quer a continuidade”, relata Daniara.
Quando se está na fase da infância, todos passam pelo processo de espelhamento. Este espelho, então, não é mais que o olhar da mãe, ou seja, a imagem existente entre o desejo materno com relação a esse filho. O olhar da mãe que, ao vê-lo, estabelece determinados atributos com os quais a criança de identifica. Este corpo unificado e reconhecido na experiência do espelho irá passar por duas grandes crises, dois momentos especiais em que será sentido como estranho. O primeiro será a adolescência, em que o corpo cresce meio desproporcionado, e o sistema endócrino traz muitas novidades, mas onde fundamentalmente há a promessa de um futuro pleno de realizações. Mas quando um idoso se olha no espelho, o que este lhe devolve é uma imagem ligada a uma deterioração, uma imagem com a qual ele não se identifica. Não há júbilo nem alegria, há apenas estranheza e ele pensa: “esse não sou eu”. Novamente uma discrepância entre a imagem inconsciente do corpo e a imagem que o espelho lhe devolve.
“O meu segredo para uma terceira idade feliz é principalmente sempre estar de cabeça erguida apesar dos problemas e dificuldades que a vida traz, ser feliz, ter alegria, dar risada. Assim se pode viver muito mais do que uma pessoa sempre fechada com ela mesma, tem que acordar com sorriso no rosto, aliado à ginástica e boa alimentação, a dança ajuda muito principalmente para a mente aonde fizemos amigos, damos bastante risada. Quando se tem problemas na família sempre colaborar, ajudar da maneira que pode, uma coisa que adoro fazer é o trabalho comunitário e me sinto muito feliz”
Pode-se, então, pensar que, enquanto a criança se rejubila ante o espelho antecipando sua unidade corporal, o sujeito que envelhece se deprime, antecipando a decrepitude da velhice e a finitude da morte.
Pelo fato de o idoso passar por essa dificuldade de aceitação do seu EU no momento do envelhecimento, acaba que muitas vezes ocorre uma tensão agressiva, voltada contra si próprio. E o corpo reage com algumas funções reguladoras de modo a ocorrer no sujeito algumas patologias da velhice que irão desde a simples depressão até a demência, dependendo da estrutura psíquica de cada indivíduo.
Em relação à funcionalidade, observa-se que as limitações próprias de um corpo desgastado pelos anos também anunciam de forma assustadora a velhice mais avançada, especialmente no que se refere à perda de autonomia e independência. No período atual que nos encontramos, o ser humano parecer estar mais sensível ao aspecto que ao estético, e é sobre as perdas de funcionalidade e força que depositam suas maiores ansiedades. O próprio corpo novamente é sentido como um estranho, porque o desejo de fazer/ação continua forte, e o corpo muitas vezes não proporciona a satisfação esperada.
Na velhice mais avançada, o que mais preocupa os idosos, na maioria das vezes, não é a proximidade da morte nem o aspecto estético da deterioração física, mas a decadência orgânica, a falta de força, a perda da memória, a doença que desencadeia na dependência. Ante a perda de objetos significativos e o aumento das dificuldades da vida cotidiana, especialmente aquelas referidas às limitações físicas funcionais, os idosos experimentam um aumento da necessidade de bem-estar, o que pode ser observado através da recorrência de algumas manifestações do EU. De modo que como muitas vezes não se encontrará a satisfação em um objeto de desejo, ocorrerá então a substituição para o investimento em uma imagem ideal do próprio Eu que estará sempre no passado. “A reminiscência pode então ser compreendida como uma forma de exercício da memória histórica que não conseguirá ser compreendido se esbarrar na falta de eco no outro e de aproveitamento do relato por parte do meio social; mas que impedirá a depressão, se achar uma escuta adequada. A reminiscência é a insistência dessa história. História que insiste em dizer que os fatos vividos foram constitutivos de uma identidade. Insistência que, como a arte de um tecelão, vai tecendo as lembranças do ser singular desse sujeito”, fala a Psicóloga.
Todos conhecem idosos que não compreendem as perdas, que persistem numa atitude de reivindicação como adolescentes exigentes, que se afundam numa raiva constante, machucam-se na depressão, ou isolam-se na demência. Mas conhecem também outros felizes, aqueles que tendo conseguido levar uma vida rica em prazeres, produtiva ou apaixonada, resignam-se a uma despedida com a tranquilidade da missão cumprida, e com um íntimo contato com as boas lembranças através da reminiscência; são estes os que envelhecem serenamente.
Então, Segundo a Psicóloga Daniara, para envelhecer da melhor maneira possível, ou seja, bem e durante um longo tempo, é necessário que exista certo investimento em objetos de amor que evite a inércia da depressão por desinvestimento, e o domínio radical da Pulsão de Morte. Em outras palavras, é necessária que se mantenha sempre viva a possibilidade da paixão.
A velhice chega de repente, mas isto não acontece sem nada que o motive. “Pelo fato de ter vivido muitos anos, nos “sabemos” velhos, no espelho podemos “ver” que o somos, mas podemos jamais nos “sentir” velhos se algum acontecimento – que será sempre anunciado pelo outro e que se inscreve no registro das perdas – não vier a construir este marco”, diz Daniara. A velhice então, não tem idade fixa ou conveniente para começar, e cada sujeito inaugura o “tempo de ser velho” quando esse é imposto, e opera com ele de acordo com aquilo que sua própria história lhe determina. Mas é aqui que reside o cerne da questão: o espelho, a aposentadoria, uma doença ou uma perda anunciam a velhice, não a morte, e a vida pode se estender por muito tempo ainda.
“É importante que o idoso não trate a própria memória como se fosse um produto descartável da moderna tecnologia”, reflete a Psicóloga.
Os idosos devem ser os protagonistas de sua história, reivindicando seus direitos de cidadania, de prazer, de reconhecimento social, mas também assumindo a responsabilidade social de serem os agentes modificadores de uma realidade que lhes é imposta como negativa a de envelhecer; inaugurando enfim, um tempo que seja de viver e não de espera passiva da morte.