O tempo finito

O tempo finito

Há um dia em que a juventude chega ao fim e o tempo haverá de arrastá-lo velhice a fora. Pode espernear, não tem volta. Só escapam aqueles que morrem antes de ficarem velhos, vitimados por alguma fatalidade. Mas ser velho traz alguns inconvenientes. No caso de retirar uma ficha de atendimento preferencial no Banco e se dirigir ao caixa, como um privilegiado, todos os outros que estão sentados, esperando pacientemente sua vez de ser atendido, vão lhe dirigir olhares raivosos, ferozes. Quando você ficar velho, a mensalidade do Plano de Saúde vai dobrar. Você vai sentir dor nas costas, vai notar que está surdo, enxerga menos, vai dizer coisas desconexas, pois está ficando caduco.

Para saber se está velho, basta observar que quando alguém quer se dirigir à ti, lhe chamam de ”senhor” e não de ”moço”. Mas a suprema humilhação é quando alguém se levanta do assento no ônibus e diz:___Sente aqui, senhor! Isso é para matar. Passei por isso numa recente viagem. Estava conhecendo a terra do meu amigo Pablo Escobar, Medellin, na Colômbia e me deslocava de trem pela cidade. Com o trem lotado eu estava em pé apreciando a paisagem pelas janelas quando uma jovem estudante levanta-se e me diz:___Tenga la amabilidad de sentarse, mi abuelito. Para quem não domina bem a língua espanhola, assim como eu, ”abuelito” quer dizer avozinho. Fiquei indignado, sou no máximo um rapaz maduro. Sofri a suprema humilhação. Olhei para os lados e, relutante, agradeci a menina e sentei. Literalmente humilhado. Destruído!

A primeira vez que me senti velho foi quando, no Rio de Janeiro, fomos visitar o Pão de Açúcar. Ao adquirir ingresso a moça, automaticamente, me disse:___O senhor paga meia! Depois falei para o Fernando, meu filho:___Como é que ela sabe que tenho mais do que sessenta anos, se nem me pediu documentos? E ele, numa pureza, sem nenhuma maldade, me diz:___Mas ela só olhou para ti, pai. Isto basta! Em verdade, minha aparência é de um senhor com mais de cem anos. Desconfio quando alguém me diz:___Você está ótimo. Traduza para:___Você está no bagaço! Esqueceram de te enterrar! Está a um passo do formol.

O velho acumula doenças, manias, faz compras sem nenhuma serventia, veste roupas inadequadas. Eu não me preocupo com o que os outros pensem ou digam. Adquiri o direito de ser velho, de estar errado e como não vou viver para sempre, faço o que quiser. Tenho direito adquirido ao longo da vida par fazer coisas esdrúxulas, expor minha barriga, sair desarrumado. Acabo de ler uma poesia de Cassiano Ricardo:___ Não foram os anos que me envelheceram, foram os minutos. No meu caso milhares deles. Por isso, meus amigos e leitores, quero viver apenas de momentos. Não quero mais que momentos. E que eu os viva intensamente. Porque adoro a vida. Adoro trabalhar, escrever, conviver com gente do bem. Faz dez anos que prometi parar de trabalhar. Desfiz a promessa dez vezes.

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