Em países com muitas influências distintas de cultura como o Brasil, é incontestável que esse fato traz uma vasta diversidade religiosa. O pluralismo religioso é algo que conforta a todos, pois assim cada indivíduo pode seguir aquilo que mais se identifica e pode praticar suas crenças sem hostilidade. O Espiritismo cresceu muito e uma de suas características forte é que a religião considera a morte apenas uma etapa da evolução pessoal.
Sirlei Figueira Fernandes nasceu na cidade de Rivera (Uruguai), no dia 17 de setembro de 1939. Quando tinha dois anos e meio sua mãe desencarnou (faleceu) e acabou indo morar com seus avós. Portanto, dos 79 anos de vida, 60 foram atuando no Centro Espírita, onde começou a atuar no ano de 1958. Durante todo esse período, ela salienta que viveu experiências marcantes em sua caminhada na qual se dissipa em novos conhecimentos e na prática das Leis Divinas. O tempo dedicado é bastante memorável, e em vista disso, o Jornal Gazeta fez uma entrevista com Sirlei questionando pontos marcantes em sua trajetória religiosa.
JGR – Como tudo começou? Sempre gostou dessa área da espiritualidade?
Sirlei- Casei muito jovem, com 16 anos. Meu marido, Antônio Rodrigues Fernandes tinha 20 anos e trabalhava no Departamento Aeroviário do Estado. Em 1957 ele foi transferido de São Borja para Santa Rosa, onde estavam iniciando a construção do Aeroporto (Campo da Aviação).
O Antônio era Evangélico, participava dos cultos da Igreja Episcopal e eu, católica. Numa certa manhã, decidimos ir a uma igreja evangélica, mas quando chegamos lá, todas as orações e textos evangélicos foram ditos em alemão e não entendemos nada. Saímos da igreja, caminhamos pela mesma rua e chegamos a um Centro Espírita (o pai do Antônio era espírita, embora não conhecesse muito a Doutrina, aplicava passes e orava pelas pessoas necessitadas). Como ouvimos pessoas falando de Evangelho, entramos, assistimos a palestra, conversamos com as pessoas e não deixamos mais o Espiritismo.
Eu estava bastante doente e os diagnósticos variavam muito, desde problemas do sistema nervoso até “loucura”. Descobri que estava sofrendo uma influência espiritual que me desequilibrou totalmente a vida. Não posso dizer que gostava muito da área da espiritualidade, mas sim, que tinha curiosidade e necessidade.
Quando comecei a estudar o Espiritismo, descobri que uma imensa área, até então por mim desconhecida nesta encarnação, se abria, descortinando para mim um mundo totalmente luminoso, educativo e reconfortante. Conheci um Deus Pai, amoroso e justo, que jamais puniria com castigos as minhas atitudes ignorantes. Passei então a entender as palavras de Jesus: “Conhecerei a verdade e ela vos libertará”.
JGR – Como a senhora resume esta experiência de tantos anos?
Sirlei- Como um céu imenso, bordado de estrelas brilhantes, onde as vezes surgem nuvens escuras, formadas pela falta de compreensão, de amor, de caridade, que são dissipadas quando a humanidade busca o conhecimento e a prática das Leis Divinas.
Foram muitas as experiências marcantes vividas ao longo desses 60 anos. Entre elas, lembro de uma reunião que aconteceu em janeiro/60, quando o Sr. Ataliba Zanoni do Amaral, Presidente do Centro Espírita, perguntou se eu conhecia, na Vila onde eu trabalhava, alguma família pobre que quisesse morar no subsolo ou porão do Centro. Perguntei porque e ele me disse que as pessoas da cidade tinham muitas restrições com a prática do espiritismo, muitas atravessavam a rua para não passarem na calçada da frente do Centro. Tinham medo. Outras jogavam pedras e quebravam vidraças, muitas vezes era o telhado que ficava danificado. No final de duas semanas concluímos que as pessoas tinham medo de aparições de espíritos. Não encontramos ninguém. Depois de três semanas nos mudamos para lá. Por 17 anos fomos faxineiros, pedreiros, pintores, zeladores do prédio. Em 1977 apareceu uma família interessada em morar lá. Necessitava de lugar para residir e se propunha a cuidar de tudo. Então fomos para nossa casa. Foram muitos anos de lutas, de aprendizado. Até um lar de passagem para atender temporariamente crianças desamparadas, tivemos nessa fase de nossas vidas.
JGR – Nestes anos todos, o que a senhora mais tem visto?
Sirlei- Uma mistura de sentimentos, ódio, alegria, descrença, esperança, revolta, orgulho… resultado da forma conturbada que vivemos.
JGR – Ainda existe muito receio do espiritismo por parte das pessoas?
Sirlei- Creio que não, há mais confusão do que receio. As pessoas confundem espiritualismo com espiritismo, Umbanda, Candomblé, com Doutrina Espírita. Acreditam que mediunidade é propriedade dos espíritas e que ela só serve para fazer previsões, curar os corpos, receber cartas dos “mortos”. Na verdade o médium é um aprendiz das Leis Morais e quando sua vivência começa a cumprir um dos objetivos da vida física ensinados por Allan Kardec, que é “amar e servir”, passa a viver as alegrias e a paz do verdadeiro cristão. Passa a entender que o corpo material é um empréstimo, um instrumento de trabalho.
JGR – O que de mais interessante a senhora já viu ou presenciou em todos estes anos de atuação?
Sirlei- Não posso nomear algo como mais interessante. Tenho visto tantas coisas acontecerem que, para mim, são maravilhosas e que para outros irmãos não são importantes… Como estou nesta Sociedade Espírita Caminho de Damasco há 60 anos, tenho visto pessoas que se curam de males físicos e espirituais, que desencarnam mais confortadas diante da descoberta de que a morte não existe, pessoas que chegam e saem sem se encontrarem consigo mesmas, irmãos que chegam e ficam servindo o próximo…Uma coisa tenho certeza: todos nós caminhamos para a perfeição e um dia seremos anjos. Deus não cria seres para lançá-los no sofrimento eterno. Se assim fosse não nos amaria, pois Ele nos conhece desde a criação até a eternidade, então sabe presente e futuro de cada um de nós.
JGR – Tem aumentado o número de pessoas que frequentam o Centro?
Sirlei – Sim, mas não é um número expressivo. O mais interessante é que alguns anos atrás as pessoas que mais buscavam a Casa Espírita tinham mais de quarenta anos, hoje quem mais busca a Casa são jovens e crianças, sinal evidente de que as previsões feitas pela Espiritualidade Superior se concretizam. Voltam a Terra Espíritos mais cultos e mais evoluídos, para orientar nos caminhos do Progresso Espiritual a todos aqueles que querem trilhar o caminho do Bem. Mas na verdade também não podemos esquecer que nosso mundo é de Provas e Expiações e por isso recebe também irmãos que necessitam de “hospitais para tratarem as almas, são aqueles que ainda chafurdam na lama do egoísmo, da vaidade, do orgulho e de tantas mazelas que acabam por lançá-los no assassinato, nos roubos, na corrupção e no sensualismo desvairado. Ainda há tempo de enveredarmos pela senda indicada por Jesus, quando nos disse: “Um novo mandamento eu vos dou, que vos ameis uns aos outros assim como eu também vos amo”. E acrescentou: “Assim como o Pai me amou eu também vos amei. Permanecei no meu amor”. (Jó – 13:34 e 15:9)
JGR – Como o espiritismo pode ajudar a vida das pessoas?
Sirlei – A Doutrina Espírita, segundo Kardec, no Livro “O que é o Espiritismo”, é a ciência nova que vem revelar aos homens, por meio de provas irrecusáveis, a existência e a natureza do mundo espiritual e as suas relações com o mundo corpóreo.
O Espiritismo vem responder ao homem as costumeiras perguntas: De onde vim? Que faço aqui? Para onde vou? Vem consolar e esclarecer que somos espíritos imortais, portanto, eternos, que fomos criados simples e ignorantes (das Leis de Deus), que somos perfectíveis, que o mundo espiritual e o material são inseparáveis e que constantemente interferem um no outro, que a reencarnação é uma prova da justiça Divina, pois suas leis não nos condenam eternamente ao sofrimento. Quem estuda e vivencia os ensinamentos de Deus e os exemplos do Mestre Jesus, não se deixa arrastar pelas queixas, pelos ódios, pelas mágoas que envenenam as almas, fazendo-as deslizar pelo resvaladouro do desamor e da tristeza. Por quê? Porque quem ama confia em Deus, porque sabe que jamais estará só, que sempre terá o abraço carinhoso do seu Espírito Protetor, além disso, aprenderá a socorrer, abraçar, amparar e mostrar o universo de amor ao próximo.
JGR- Suas considerações finais:
Sirlei – Estudar a Doutrina Espírita não é comprometer-se com uma Casa Espírita, não é ser obrigado a ser espírita, é comprometer-se consigo mesmo, com a sua consciência, com seus irmãos, com a casa de Deus, que é o Universo, portanto também a Terra. Mudar de Igreja não retira de você o conhecimento, não rompe seus laços com a verdade… Ore e confie. Quando você aprender a orar, sentirá o coração cheio de gratidão pela vida, pela oportunidade de renascer, pelos sofrimentos que são lições e oportunidades de progresso. Quando você aprender a orar, vai descobrir a amplitude de seus pensamentos, o bem que você pode fazer, enviando através deles a paz, a esperança e a saúde.
Quando você aprender a orar, vai descobrir o céu recamado de estrelas, levando a luz que ilumina o mundo para que caminhemos com sabedoria e confiança pelas vias do conhecimento.
Quando você aprender a orar, você vai descobrir que só o amor ensinado pelo Pai constrói uma vida eterna de Paz, de humildade, de fé…
Seja caridoso, ore por você, pelo seu próximo, pelos seus familiares, pelo seu País. Ore com fé.