Vive-se nos últimos dias, um cenário de angústia e incertezas. Incertezas do que está por vir, sem saber ao certo o que pode acontecer. Um vírus minúsculo mudou literalmente a vida de cada um, inclusive das crianças, que bruscamente tiverem sua rotina alterada e não tem ido mais às escolas.
Isso, de certa forma, altera o comportamento dos pequenos. Para isso, a reportagem do Gazeta conversou com a Psicóloga Patrícia Suculotti, para ver qual é a realidade que ela tem presenciado em seu consultório. Confira:
JGR – Há relatos/reclamações por parte de pais em seu consultório, de que crianças estejam mais nervosas neste período?
Observo no consultório as duas realidades, tanto pais angustiados e queixosos sem saber como lidar com as ansiedades dos filhos, quanto pais tranquilos e com uma rotina bem estabelecida e organizada.
JGR – A ausência da escola pode ocasionar esta irritação nas crianças? Por quê?
A ausência da escola pode sim contribuir para uma maior irritação porém, ela sozinha não é o desencadeador. Estamos vivendo um senário muito assustador, com muitos medos e incertezas e um futuro que não sabemos ao certo como será. Se para nós adultos está difícil, quem dirá para as crianças e os adolescentes. A criança necessita brincar, ser estimulada em sua criatividade, ver os amigos, aprender, e quando boa parte destas necessidades estiver faltando, a ansiedade como consequência será muito maior. O adolescente por sua vez, busca o grupo como forma de individuação e independização, estar junto aos pais representa ser criança novamente e estar próximo ao mundo infantil. E diante desta pandemia, o jovem encontra-se novamente em casa, exclusivamente com seus pais e sem poder ter contato direto com o mundo lá fora. A adolescência já é, desde antes da Covid-19, uma etapa onde se registram altos índices de crises de ansiedade, depressão e suicídio, e a situação atual pode ser um complicador na saúde mental dos jovens. Por isto, os pais devem estar atentos aos sinais de ansiedade e depressão e se for necessário, busquem ajuda de um profissional.
JGR – Como se pode lidar com esta situação?
Converse com seu filho sobre o que estamos vivendo, utilizando uma linguagem que ele entenda, e enfocando apenas em aspectos essenciais, como por exemplo, o que é o COVID, como se proteger adequadamente e o por quê que não podemos conviver com nossos avós neste momento. Além disso, não esqueça de acalmá-lo, trazendo tranquilidade e principalmente esperança.
JGR – O que seria indicado fazer neste período para tentar amenizar a ansiedade dos pequenos?
* Através de brincadeiras estimule a criatividade das crianças. Os pequenos devem brincar, pois aprendem muito dessa forma. Além dos brinquedos prontos, estimule a criatividade por meio de atividades mais dinâmicas, como por exemplo, plantar uma flor, fazer uma receita ou trazer aquelas brincadeiras antigas que talvez seja da infância de muitos pais como carrinho de rolimã, pular sapata, passa anel e muitas outras brincadeiras antigas divertidas e que contam a história dos pais. Sempre que for possível, criar brincadeiras que fujam das telas de celular e da televisão.
* Estimule seu filho a brincar sozinho. Em algum momento a criança vai precisar ficar sozinha, pois você precisará fazer outras coisas (a não ser que tenha um irmão, por exemplo). Ensine-o a brincar de lego, montar quebra-cabeça, desenhar, pintar. Desenvolver a capacidade de brincar sozinho é muito importante para o desenvolvimento saudável.
* Faça uma sessão cinema em casa. Junte toda família e assistam um filme, com direito a pipoca e guloseimas.
* Neste período da quarentena, crie uma rotina para seu filho (a). Isso ajudará a organizar o seu dia e manterá a criança ocupada nos momentos em que você precisar focar no trabalho ou alguma outra atividade. Explique que a quarentena não é férias, precisam fazer as atividades escolares dentro do prazo, como também auxiliar nas tarefas da casa. Além disso, a necessidade da criança e do adolescente ter uma rotina deveria ser seguida com ou sem quarentena.
* Defina horários para uso saudável de telas, evitando ultrapassar os limites sempre que possível. Usar a tecnologia também para fazer vídeo conferências com os avós e familiares, pois vê-los em boa saúde pode tranquilizar as crianças, além de acalmar um pouco a saudade!.
* Procure ver as notícias sozinhos, sem expor as crianças a conteúdos inadequados. Os pais devem repassar os conteúdos necessários a eles em linguagem adequada.
* Para filhos adolescentes a vida social é importante e pode e deve continuar; use as ferramentas tecnológicas em prol disso. Utilize aplicativos que permitem os encontros virtuais neste período de quarentena.
JGR – Isso pode se tornar um problema mais sério?
Se as crianças tiverem acesso as informações necessárias e, mesmo sem aula e sem os amiguinhos, esteja tendo uma rotina com tarefas e atividades lúdicas, este período poderá ser vivido de maneira prazeirosa apesar da saudade dos amigos e do colégio. Ao mesmo tempo é necessário que se sintam amparados e protegidos pelos pais, com um ambiente estável e tranquilizador.
JGR – Como observar se o comportamento é sinal de problema?
Os parâmetros de gravidade diz respeito a duração, intensidade e grau de incapacidade que os sintomas estejam causando. Se o sofrimento não cede, ou reincide em pouco tempo apesar das medidas de acolhimento e orientação dados pela família, talvez seja o momento de procurar uma ajuda profissional. Ao perceber que a criança ou adolescente está com dificuldades, procure observar e escutar de forma atenta, com serenidade, para acolher e trocar algumas palavras ou gestos que lembrem aquele que está sofrendo que ele não está só. Que estamos passando por um período que tem tempo para acabar, e que estamos fazendo este esforço para nos cuidar e para cuidar de todas as outras pessoas. E que quando este período de isolamento terminar, poderemos voltar a encontrar com os amigos e familiares, frequentar os parques, as praças, voltar a fazer o que fazíamos anteriormente e que nos dava muito prazer.
JGR – Deixar os pequenos a par de tudo que vem acontecendo, pode assustá-los e torná-los adultos com algum tipo de sequela no futuro?
Deixar a criança a par de tudo pode sim assustá-la e gerar um sofrimento desnecessário. As informações devem ser fornecidas de acordo com a capacidade de entendimento de cada criança, segundo a sua idade cronológica.
Por: Micheli Armanje