O boteco

O boteco

Vamos tomar uma coisinha! Hoje eu estou pagando. E o cara feliz, acompanha o amigo até o bar da Rodoviária. Ali, o ambiente reflete a irmandade que o frequenta. Os simpáticos Casquinha e Daiane são os proprietários. Ao abrir, sete horas da manhã, antes de irem pra o serviço, já estão os primeiros fregueses de plantão, para dar um “talagaço”, daquela que matou o guarda. Os “bulichos” ainda respiram e se respiram, ainda estão vivos. Os frequentadores de boteco formam uma irmandade particular, um grupo social à parte que se encontra para confraternizar. Bar é uma instituição nacional. Sempre estarão presentes, nunca vão desaparecer! Em Tuparendi a Rodoviária fechou, o bar do Casquinha continua mais vivo que nunca!

O bar da Rodoviária, fica ao lado da minha morada. Fico observando sua variada fauna, brancos, pardos, pretos. É o ponto de concentração dos paraibanos que chegam à cidade para vender redes, cintos de couro de cabra, carteiras, frutas e outras quinquilharias. Muitos agricultores, ao descerem do ônibus, dirigem-se ao balcão para o primeiro gole do dia, para limpar a goela antes de enfrentar a maratona pela cidade. Todos falam a mesma língua, sem preconceito de cor, política ou religião. Todos falam de tudo e de todos. Boteco é cultura. Por ali imperam as risadas, as histórias, os silêncios. Por ali se faz o jogo do bicho, se joga mini snooker! Observo coisas que julgava que não existiam mais, como a cachaça de alambique, a purinha, o samba, uma mistura de coca-cola com cachaça. Os fumantes são em profusão. Uma nuvem de fumaça paira sobre a calçada e sobe até a sacada do meu apartamento.

Lembro de um amigo, Milton Waldow, assíduo frequentador de botecos e profundo conhecedor de licores, mistura de cachaça com qualquer coisa. Ele, ao final da vida, tomava cachaça com jurubeba mas havia passado pelo consumo de cachaça com butiá, jabuticaba, manga, pitanga e tantas outras. Na verdade a fruta serve de desculpa para o cara consumir a cachaça.

Na mesa ou no balcão do bar se exercita a filosofia, num bate papo que é exclusivo da raça brasileira. Às vezes alteram o timbre da voz, parece que vão partir para via de fatos mas logo estão abraçados, felizes. O brasileiro é assim: expansivo, porém amável, pacífico. Lembro da piada daqueles três americanos sentados à mesa de um bar. Um deles olha pela janela e diz que acha que vai chover. Meia hora depois o outro diz que acha que não vai chover. Trinta minutos depois o terceiro diz: vou embora porque não gosto de discussão. A arte da discussão, da boa conversa, é para brasileiros. Ninguém imita, nem castelhanos!

Lembro de quando tomei meu primeiro porre. Foi na capela, em frente minha casa, no interior de São Francisco de Assis. Um tio, o Diodoro, muito gaiato, comprou um litro de vinho tinto e presenteou a mim e mais dois primos. Penso que não tínhamos mais que oito ou nove anos. Viramos tudo de uma vez só. Não morri ali mesmo porque Deus queria me testar por mais uns oitenta anos, neste vale de lágrimas. Até hoje sinto náuseas ao cheirar vinho tinto. Aprendi, pelo menos, que podemos consumir álcool, desde que com moderação, equilíbrio e harmonia. A arte de bem beber se contrapõe ao alcoolismo. Jesus Cristo não consagrou a coca-cola, o leite, consagrou o vinho como alimento do espírito.

PS. Não procure comprar leite no “bulicho” do Casquinha. Você não vai encontrar. Mas terá a cerveja mais gelada da cidade, cachaça de alambique com 21 graus, caipirinha nota dez e a possibilidade de ouvir as conversas mais divertidas que você já ouviu!

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