Quando escrevo sobre bares, bêbados, gaiatos frequentadores de balcões, dedico sempre essas mal traçadas linhas ao meu guru, meu mentor, meu amigo de afetuosa memória, meu tio, Protásio Medeiros. Homem de juízo sensato, amizade infalível, guia generoso. Hoje é apenas um esqueleto mas sua memória fica comigo. Lembro dele nos bares de Camaquã ou Arambaré, cervejinha em punho, sempre justificando que a bebida controlava a pressão arterial, combatia a esclerose, refrescava no verão, aquecia no inverno.
Quem sabe daí me vem o hábito, triste hábito, diriam os puritanos, de gostar de uma cerveja bem gelada. Estava no Bar da Preta, onde servem uma cerveja que vem com uma película de neve, sem congelar. Ninguém resiste. Em frente ao copo eu esperava uma amiga estudante que pretende fazer doutourado na Espanha e venho me informando da maneira mais fácil de encaminhar essa menina. Como ela demorava aproveitei para praticar meu esporte preferido: ouvir conversa alheia. Na mesa ao lado o cliente mais assíduo da Lancheria, um morador de São Marco. Uma simpatia. Noutra mesa, uma figura conhecida na cidade mas que me abstenho de dizer o nome. Nunca o vi trabalhando. Aparência saudável, alegre, ativo mas sempre usufruindo de auxílio doença. A cada mês tem uma enfermidade diferente. Parece que dedicou a vida a evitar o trabalho. Tomava também sua cerveja gelada. Quando alguém o chama de “boa vida” ele ainda acha que é elogio. Pensei, naqueles que estão realmente doentes e têm negligenciado seus direitos. É preciso acabar com privilégios injustos.
Estou fugindo do assunto mas escrever é conversar consigo mesmo. Olhei para o relógio, minha amiga não chegava e pedi mais uma cerveja. Nisso ouvi uma conversa num tom irônico, debochada. Uma quarta figura menosprezava o trabalho de embelezamento da Praça e olhando para uns bonitos vasos de flores disse:___ Bom para fazer um alvo de revólver. Ora, no Brasil da CPI’s que terminam em pizzas, no país dos fraudadores do INSS, dos corruptos de todos os matizes, dos antiéticos, dos larápios, não me venham botar defeito num dos trabalhos mais relevantes dos últimos tempos praticado pelo serviço público em nosso município. É um ato voluntário, desprovido de interesse e realizado pelas primeiras damas. Um esforço constante de criação e manutenção. Vamos respeitar. Digo isso olhando nos olhos de quem quer que seja pois o faço em testemunho da verdade, porque nunca fui puxa saco.
Falar mal do paisagismo de Tuparendi é mexer com casa de marimbondo. Sou um sujeito calmo, não puxo da minha pistola faz um bom tempo. Uso outra arma, a linguagem, escrita ou falada. Pedi licença para entrar na conversa. Fiz uso do verbo.___ Vocês devem ser uns medíocres, frustrados, invejosos, infelizes. Olhem os trevos de acesso a nossa cidade e comparem com qualquer outro. E olhem que nem é de competência do município cuidar dos trevos de acesso e sim do DAER. Vejam nossas praças, os canteiros centrais. Nunca antes foi tão bonito. Não me venham desdenhar. Vão até a Barbearia do Renato Patias e olhem a nossa praça. Vocês fariam melhor? Dá para melhorar? Dá. É o que elas estão fazendo, todos os dias, enquanto vocês, que se julgam perfeitos, expõe suas mágoas. O efeito foi o mesmo de um soco do Mike Tyson. Nocaute.
Sorte que minha amiguinha chegou! Estranhou o silêncio. Pedi desculpas a todos e nos afastamos. Fomos a outro bar conversar. A cerveja não era tão gelada!