O Tribunal do Júri, que tem a função de substituir o Juiz togado para julgar réus por crimes dolosos contra a vida (homicídio, feminicídio e aborto fora da lei), tentados ou consumados, está em queda livre. Se dependesse de mim, já teria desaparecido. Por que da minha rejeição? Por não achar sequer razoável retirar processos das mãos de experts em Direito para submetê-los a pessoas alheias ao Direito.
Instituído ainda no ano de 1822, e apenas para os crimes de imprensa, o júri se sustenta no saudosismo representado pelo desfile, no Tribunal do Júri, de oradores a mancheia. Grandes tribunos revelou, é verdade. Entre nós, cito o maior: Daltry Cardoso Teixeira. Outrossim, até o fim do século passado, o povo lotava o salão júri quando das suas sessões. Hoje, sequer toma conhecimento.
Agora, o STF vai mudar o júri nos casos de absolvição por “clemência” (contrária à prova). Ocorre que julgar fora dos autos é do DNA do júri. Não por acaso, sete pessoas leigas julgam seus iguais. Nos casos de clemência, porém, cabe ao TJ decidir por novo júri. Com efeito, tive um caso em que o TJ-RS, provendo recurso do MP, não só ordenou novo julgamento como recomendou à Vara Criminal que escolhesse um novo Conselho de Sentença que soubesse julgar. Ou seja, passou um trator sobre sua soberania.
No caso em comento, o STF está legislando. Ao vetar decisões contrárias às provas, suprimirá a essência do júri, que é decidir fora dos autos. É uma maquiagem. “Mutatis mutandis”, já se disse que, depois que inventaram o trator, não adianta aperfeiçoar o arado de boi. Resta, ao implemento rural, uma placa de Honra ao Mérito em sua relha.
Lembro que outra mudança já foi consumada pelo Supremo, em havendo condenação pelo Júri: a imediata prisão do réu. Uma medida positiva contra a impunidade. Mas é exceção. A impunidade grassa no país por força da legislação frouxa e da jurisprudência generosa. O clamor é pelo endurecimento da lei, mas tem resistência de toda ordem.
A propósito, a partir da Lava-Jato, aumentou. Há pouco, Lula vetou o fim das “saidinhas” de presos do semiaberto. E antes, o STF, depois de ordenar, em 2016 e 2018, a execução da pena em seguida à condenação em 2º grau, em 2019 recuou para decretar a prisão somente após o trânsito em julgado da condenação. Com isso, milhares de réus condenados em 2ª instância foram soltos, inclusive o Lula.
Sou pela supressão do júri. Alinho razões, sem exauri-las, como: 1) jurados, ao contrário de juízes togados, não têm intimidade com a lei; 2) custo absurdo do júri – vide Boate kis/Sta. Maria, Bernardo/T. Passos; 3) jurados julgam por amizade ou inimizade com advogado ou promotor, por amizade ou temor com o réu etc; 4) jurados leigos não têm conhecimento técnico para avaliar o embate entre promotor e advogado.
Por fim, pensa comigo. Você, jurado, condenaria Marcola ou Beira-Mar – para ficar com dois criminosos distantes -, sabendo que ao sair do Tribunal Júri poderá ser inquirido por um “filho” do PCC ou do CV? Sei a resposta. É também a minha.
Já a decisão do STF (falta só publicar) antes comentada, não elimina o júri, é verdade, mas o mutila por atacar o centro de gravidade da sua existência, a sua soberania.