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Uma conversa sobre sucessão familiar na propriedade rural

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Clóvis Medeiros

O Dr. Flávio Cazarolli, durante a Expoagro, em Santo Cristo, proferiu uma excelente palestra sobre o tema. O colaborador deste jornal, além dos conhecimentos que adquiriu nessa palestra, leu inúmeros textos, assistiu programas de televisão, conversou com intelectuais da área, ouviu jovens agricultores. De tudo isso, fez uma sinopse, e o que julgou mais consistente, incorporou ao texto para que fique mais substancioso e menos inculto. Soma-se ao fato, sua profissão ligada ao meio rural e a experiência profissional como funcionário da Ascar/Emater por longos anos. Permitam, de forma ambiciosa, examinar a problemática da gestão futura da propriedade rural.

Estamos entre os três maiores exportadores de alimentos do mundo. O agronegócio representa 25% do PIB. Nem se discute a importância para a economia nacional. Só chegamos lá porque temos mão de obra qualificada e capacidade de trabalho. Produzimos uma tonelada de alimentos por habitante, em breve teremos que produzir duas, três toneladas por habitante. A área rural é conservadora nos costumes, mas, definitivamente, não é atrasada. As gerações foram se sofisticando, estudando, especializando. São jovens com esse perfil que irão conduzir o negócio rural quando os pais se aposentarem ou morrerem. Ou não.

No entanto, precisamos entender a diferença entre herdeiros e sucessores. Herdeiros todos somos. Todo o patrimônio tem herdeiros, nem todo o patrimônio tem sucessores. Herdeiro é aquele que recebe os bens que formavam o patrimônio daquele que morreu ou se aposentou. Sucessor é aquele que substitui a função, a gerência do negócio. É o que dá sequência ao negócio. A sucessão ocorre por vontade, por disposição, por vocação sucessória. É preciso habilidade para continuar a administrar o agronegócio. Ser herdeiro é um simples direito legal. Ponto.

O que está acontecendo, tanto aqui, como nos países da Europa, é que apenas 5% dos filhos de agricultores estão permanecendo no campo. O sonho dos pais é passar o bastão para os filhos, embora a maioria não prepara esses filhos para a sucessão. Não se preocupa em formar Médicos Veterinários, Engenheiros Agrônomos, Zootecnistas, Técnicos Agrícolas, para assumirem a administração da propriedade. Antigamente a verdade absoluta era:___Se tu não quiser ficar na roça, estude. Hoje se diz:___ Se quiser ficar na roça, estude. Atualmente se trabalha com tecnologia de precisão, tecnologias digitais, softwares agrícolas. Há que se reconhecer que muitos pais têm o olhar míope. Vêm os filhos como crianças. Sequer permitem que o filho tenha seu próprio Bloco de Produtor. Não dá autonomia para o jovem, não deixa participar da tomada de decisão. Se o filho falar em administrar a propriedade no futuro o pai lhe diz:____Ué, acha que estou morrendo? Então, a lógica é ter cada vez menos jovens no campo.

Existe uma diferença na forma de pensar entre as gerações. Objetivos diferentes, visões que não coincidem. O pai trabalha para garantir o futuro. O filho diz que o futuro é agora. O pai quer ganhar dinheiro para sua segurança no futuro. O filho quer ganhar para gastar agora, viajar, se divertir. O que motiva o jovem a ficar na propriedade é o dinheiro, a inovação tecnológica, é participar das decisões, é o reconhecimento da família. Além disso, o gosto pelas atividades agrícolas se adquire pelo hábito. Deve ficar claro que a rotina da propriedade é contínua, de segunda a segunda, mas que deve ser encarada como um ambiente profissional. É preciso entender que numa propriedade rural deve haver regras, disciplina, horário, hierarquia. Se o guri ou a guria não se criou na lida, dificilmente vai gostar dela depois de adulto. As chances de que um jovem que estava na cidade, volte para o campo para administrar a granja, dê tenha sucesso, são mínimas. É difícil combinar interesses diferentes. Em época de colheita, plantio, preparo do solo, ordenha, fica impossível sair durante três ou quatro dias para o Rodeio, para a balada e dormir até o meio dia. Os pais devem equilibrar regras e afeto. Ensinar a lutar. Facilitar demais é matar a vontade de conquistar as coisas. Alguém escreveu um poema que dizia mais ou menos assim:___Dê a quem você ama, asas para voar, raízes para voltar, motivos para ficar.

Os pais nunca sabem que resultados virão da sua tentativa de incentivar filho a ficar na lavoura, mas se não fizerem nada, certamente, não existirão resultados. O tema da sucessão deve ser conduzido enquanto o jovem é solteiro. Depois do casamento fica mais difícil. Como falei no início do texto, apenas cinco por cento dos filhos estão dando continuidade ao negócio rural. Entre as inúmeras alegações para o jovem ir para a cidade está a distância da granja até a cidade, a falta de recursos, difícil acesso a tecnologias, falta de mão de obra, desconhecimento do negócio, tamanho da propriedade. Migram para a cidade em busca de emprego, diversão, estudo, oportunidades. Quando não existe interesse os herdeiros vendem a terra. Uma vez dividida, dificilmente sobrevive. Fracionada, não se sustenta. É a pulverização da propriedade que será absorvida por outro grupo, na maioria das vezes, mais concentrador. Aliás, nenhuma propriedade deixou de produzir em nenhum lugar do mundo. Pelo contrário. Grupos gerenciais maiores que adotam tecnologias modernas, aplicam insumos necessários, tecnologias modernas e isso vem aumentando os índices de produtividade, ao contrário da pequena propriedade, com baixo grau de investimentos. Nesta última, normalmente vimos culturas de subsistências, com vendas dos excedentes, a família vivendo às custas de alguém aposentado na família, os filhos desestimulados, pois se criam ouvindo os pais, falarem mal do clima, do governo. Essa visão negativa de tudo faz com que o jovem vá procurar emprego na cidade.

Senhores, não existe uma fórmula mágica, não existe uma receita. O jovem vai permanecer no campo, se receber os estímulos adequados dos pais, se adquirir nível de conhecimento formal ou se esse conhecimento foi adquirido desde a infância. Isto é fundamental. Quando nos referimos ao termo “jovem”, fazemos alusão a homens e mulheres. Cabe destacar que a possibilidade de que o pai encare o fato de a filha mulher vir a ser a sucessora é pouco considerada. Raros são os casos vistos com naturalidade. Machismo? Fator cultural? Mas então voltemos ao fato de que para assumir a gestão de uma granja conhecimento é fundamental. Nesse contexto, Tuparendi tem os melhores exemplos de jovens que administram grandes grupos empresariais agropecuários.

Mariane Moz, Médica Veterinária e Marjori Ghellar, graduada em Gestão Financeira, são destaque entre sucessoras que alcançaram êxito absoluto em gestão da produção de leite na região. Seus exemplos de sucesso são referência divulgados para outros municípios e até mesmo para todo o Brasil. Em muitas oportunidades essas jovens participaram em programas de televisão, transmitido ao vivo para todo o país, proferiram palestras, contando suas experiências no agronegócio. Ou seja, jovens agricultores com esse perfil deveriam permanecer no seu habitat natural, fazendo parte dos 5% de gerentes competentes do agronegócio. Perdão pelo trocadilho, mas isso é exemplo de sucessão com sucesso!

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